domingo, 4 de dezembro de 2011

Por que a Cyrela decidiu acabar com as parcerias fora de São Paulo e cuidar, sozinha, de seus empreendimentos em todo o país

Fazer fora ficou caro

  • Obras do Le Parc, em Salvador
São Paulo - Acostumado a jornadas de trabalho que chegam a 16 horas por dia, o empresário Elie Horn, controlador e presidente da construtora Cyrela, acrescentou um novo compromisso à sua agenda neste ano.

 

Desde janeiro, Horn passou a se encontrar uma vez por semana, na sede da companhia, em São Paulo, com os engenheiros Rogério Raabe e Antônio Zorzi para acompanhar os indicadores de eficiência de seus 200 canteiros de obra espalhados pelo país. Até 2010, havia um bom motivo para esses encontros não acontecerem: muitos dos indicadores nem sequer existiam.

As informações sobre o andamento das obras estavam, em grande medida, dispersas nas mãos de 11 parceiros regionais, que concentravam cerca de 80% das obras da Cyrela. Fazer parcerias com construtoras regionais foi a estratégia de expansão usada pela construtora de Elie Horn após a abertura de capital, em 2005.

A aceleração do crescimento dos negócios nesses moldes, porém, rapidamente mostrou seu preço. Cada parceiro compilava os dados de suas obras conforme critérios próprios, fazendo com que Horn e seus executivos ficassem no escuro num momento decisivo para a Cyrela e para o mercado imobiliário brasileiro.

Entre 2005, ano do IPO, e 2010 as receitas da empresa foram multiplicadas por 7, alcançando 4,8 bilhões de reais — nesse ritmo, o que parecia ser apenas descontrole se transformou num buraco considerável.

No ano passado, os custos das obras estouraram em cerca de 533 milhões de reais, ajudando a derrubar o lucro previsto de 800 milhões para 600 milhões de reais no período.

A entrega dos imóveis começou a atrasar. Na Bahia, por exemplo, onde a parceria da Cyrela com um sócio local enfrentou os maiores contratempos, os cronogramas de dois dos oito canteiros estão atrasados em seis meses.

“Quando percebemos que o orçamento e o custo das obras não iam bater, já não dava mais tempo de tomar medidas para reverter”, diz Ubirajara Spessotto, diretor-geral da Cyrela. “Não foi culpa do mercado nem da economia. Fomos nós que erramos.”


Intercâmbio cultural


Feita a constatação, a Cyrela colocou em marcha um plano para tentar reverter a situação. Entre julho de 2010 e julho deste ano, todas as parcerias realizadas fora de São Paulo — em Minas Gerais, na Bahia e em Buenos Aires, na Argentina — foram desfeitas.

Restaram quatro, todas em São Paulo, que poderiam ser acompanhadas de perto. Na maioria dos casos de rompimento, a Cyrela comprou a fatia do sócio local, de modo a manter sua atuação nas 67 cidades em que operava. Essa foi a solução adotada inclusive no empreendimento Le Parc, em Salvador, um enorme condomínio com 18 torres e 1 138 apartamentos.


Segundo EXAME apurou, o estouro dos orçamentos previstos na construção do Le Parc chegou a 80 milhões de reais, e os engenheiros que trabalharam na obra relatam até furto de material por operários. Em julho, a Cyrela comprou os 20% da sócia baiana, a construtora Andrade Mendonça, por 10 milhões de reais, e assumiu integralmente as obras.

O desmanche das parcerias foi acompanhado pela decisão de implantar no restante do país os padrões de produção que a Cyrela mantém em São Paulo. Cerca de 10% dos engenheiros com mais tempo de casa foram transferidos para outras regiões a fim de encabeçar uma espécie de “intercâmbio cultural”.
Uma das funções desses profissionais é treinar a nova equipe contratada para compor as unidades regionais — nos primeiros nove meses do ano, a Cyrela aumentou de 4 400 para 5 500 o número de operários próprios e ampliou seu quadro de engenheiros de 100 para 163 profissionais.

Outra meta é colocar numa mesma linha a produtividade da mão de obra. Em São Paulo, um operário consegue erguer 40 metros quadrados de alvenaria por dia.

No Nordeste, a média diária não passa de 10 metros quadrados. “Voltar a fazer tudo internamente aumentou os custos administrativos da empresa em 40%, num primeiro momento”, diz Luiz Mauricio Garcia, analista do Bradesco especializado em construção civil. “Mas esse esforço será compensado no futuro.”


Recuperação


No presente, os resultados começam a melhorar. No terceiro trimestre, a Cyrela apresentou um lucro de 146,8 milhões de reais, acompanhado de uma margem Ebtida de 19%. O patamar histórico era de cerca de 20% — mas havia caído pela metade no final de 2010.

Com isso, suas ações valorizaram 28% entre o final de outubro e o dia 10 de novembro. (No mesmo período, a PDG, atual líder de mercado, avançou 21%.) “O pior momento da Cyrela já passou”, diz Wesley Barnabé, analista do Banco do Brasil.

Depois da má experiência com as parcerias, a Cyrela decidiu deixar o crescimento regional para depois e concentrar-se na recuperação das margens operacionais e do lucro. Segundo executivos próximos a Elie Horn, por trás de tudo isso está a meta de voltar à liderança, perdida no ano passado para a PDG. Antes disso, a Cyrela terá de reaprender a crescer sozinha.


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